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AINDA FALANDO DE ADOLESCÊNCIA


No artigo anterior, falávamos da grande angústia que se abate sobre o adolescente durante todo o seu processo maturacional, com seu medo de não conseguir dar conta dos novos desafios e responsabilidades da vida adulta.

“ Os filhos dos pássaros, confiantes nos pais que os encorajam a voar, e sendo dotados para bater asas, lançam-se do ninho para nunca mais voltar. Seus pais os acompanham por uns tempos na nova vida, e em algumas semanas, eles não precisam mais de ajuda. Aqui o filhote termina seu aprendizado, e cumpre seu destino”.

Mas o humano não faz isso, não tem esse tempo definido, não tem coragem e não o deseja, porque tem vínculos afetivos que teimam em não separar os que se querem bem. Mesmo que seja uma idéia egoísta dos pais e que faça mal em algum momento da vida do filho, isso acontece porque os pais não sabem se o filho está pronto para ser lançado rumo à independência e autonomia, e cumprir seus desígnios.

Ao adolescente resta permanecer dependente no lar, porém, contestando, criticando a tudo e a todos, e proclamando aos quatro ventos que “vai sair de casa assim que fizer dezoito”...

É como se uma parte dele quisesse ficar onde está no desenvolvimento, e outra parte quisesse se lançar e crescer. Se os pais não o encorajam, ele vai precisar se virar sozinho para sair da adolescência e ganhar o mundo, e isso bem depois dos dezoito.

O adolescente trás consigo resquícios da infância, tempo de farta onipotência, isto é, como criança acreditava que podia que o mundo era seu, e através de seu pensamento mágico, todas as coisas poderiam acontecer. E agora se confronta com a realidade que diz da sua impotência, da sua fraqueza e fragilidade. Justamente nesse momento em que se dá conta de que o mundo não é mágico, ele não pode desprezar a onipotência, necessitando dela para se lançar, ou até para poder “afiar bem a língua” e dar respostas contestadoras.

Como Deus é pai, nos dotou com recursos para dar uma “mãozinha” quando necessário. Portanto, o tempo todo de nossas vidas desenvolvemos mecanismos que nos defendem emocionalmente, que chamamos de mecanismos de defesa psicológica, e a onipotência é um desses mecanismos que continua presente nessa fase, mais do que nunca. Sofrendo e necessitando de ajuda, lá estará algum mecanismo para colaborar, e que desenvolveremos (se pudermos, é claro). Com isso funciona na vida do adolescente?

O adolescente necessita acreditar que será capaz de vencer a grande dificuldade que é viver. Ao deparar-se com o mundo real, sente uma profunda dor – a dor da existência, pois sua consciência lhe diz que o mundo não é dele, existindo uma ordem para as aquisições e conquistas, que nem tudo é prazer, e que deve ter medo, ao contrário dos pássaros. Autonomia e independência são processos que demandam muitas responsabilidades.

. Ele tem uma enorme gama de situações e sabe que poderá ou não se sair bem; mas se não acreditar que é possível se sair bem, não vai, com certeza, dar nenhum passo. Fica angustiado entre acreditar que pode ou que não pode.

Então veja só, a onipotência precisa ser usada para acreditar que pode. E nessa fase, ele amplia, maximiza todas as coisas, inclusive esse mecanismo de defesa.

Além de nos falar coisas pesadas, (e muitas vezes verdadeiras), transita da onipotência muito aumentada (pode tudo e muito), à impotência total (o coitado, que tem pais incompreensíveis, incapaz, que só perde).

Chamo a atenção dos leitores para essa fase, pois é aqui que o jovem corre um grande perigo. Como está usando lentes de aumento para todas as situações, acredita ser insuperável, intocável. Nunca ele, justo ele, o “bonzão do pedaço”, vai provocar um acidente com o carro, ou vai se machucar num racha, ou vai engravidar, ou adquirir doenças sexualmente transmissíveis. A Organização Mundial da Saúde aponta para índices alarmantes de gravidez no Brasil, mostrando que pelo menos um quarto dos partos brasileiros é das mães menores de dezoito anos. Elas são esclarecidas, sabem se proteger, já viram colegas engravidarem, mas não acreditavam que poderia acontecer com elas. Elas, não!!! Pois é.

Os leitores sabem porque o seguro de veículos é mais caro quando há alguém menor de vinte e quatro anos na condução, não é?

E temos ainda o perigo que ronda o jovem (como o gato esperto espreitando o jovem passarinho), em sigilo, as drogas lícitas e ilícitas. O contestador experimenta por curiosidade, a usa por rebeldia, infringe a lei do proibido porque ousa e permanece usando, por achar que pode parar quando quiser. Ele tem o comando, é o que pensa, mas não tem. É só a onipotência exagerada agindo, e aqui o desfavorece.

Então, nesse momento, cercá-lo de atenção é prudente. Não estou falando de impedi-lo a viver, mas sim, observar e direcionar sua conduta sempre que necessário. Afeto é o que ele mais necessita, e lembre-se, leitor, direcionamento, ensinamento de valores, bem como limites e um sonoro não, isso é o mais puro afeto; além do elogio, carícias e conversas.

Assim, você vai dar uma força para ele, que necessita e quer isso, porém sem discursos, mas com atitudes adultas ponderadas. Agora ele necessita muito mais de ajuda (como o pássaro filhote no chão), do que conselhos. Ele quer caminhar sozinho, não quer saber o que você passou na sua adolescência. Necessita alguém maduro o suficiente para encoraja-lo, e dizer que ele conseguirá todas as coisas por ser competente. Alguém que não queira ser também um adolescente (adultecente).

Toda atenção agora pai (e mãe), para você. Já guardou seu mecanismo de onipotência? Será que está suficientemente amadurecido para não competir com seu filho? Preste atenção em suas opções de roupas, vocabulário, gostos musicais, e outros. Se estiver muito parecido com seu filho, é melhor você se rever. Dê a vez para o seu adolescente.


Matéria publicada no jornal dia 10 de abril de 2006

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