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TOQUE-ME POR FAVOR


Toque-me, por favor!

Pode-se notar que algumas pessoas sentem dificuldade para tocar em outras, mesmo que essa outra seja alguém da sua intimidade. Certa vez, ministrando um programa de treinamento para empresa, percebi o quanto tocar desperta emoções que podem deixar constrangimento, vergonha, enfim, uma espécie de mal estar qualquer. A pessoa estranha entrando na nossa dimensão da intimidade causa desconforto. Mas, é por onde iniciamos o contato com a realidade, conhecendo e apreendendo o mundo, através dos toques de nossa mãe. Tudo o que sabemos enquanto somos bebês até os seis meses de vida, é passado através do som e do toque. A mãe com sua paciência e altruísmo, fala e manipula o bebê o tempo todo para atender suas necessidades físicas e suas necessidades emocionais. E depois entram na relação o pai, irmãos, avós, e outros parentes. Todos tocando o bebê, e no bebê. Até estranhos se sentem no “direito” de apertar as bochechas do bebê. Somos então condicionados a entender que o mundo é o mundo do toque, certo? Mas a certa altura da idade, após a infância, os toques começam a rarear. O interessante é que somos mesmo seres de contato, de vínculos afetivos, mas quando nos tornamos adolescentes, já pouco tocamos ou somos tocados por nossos pais. Parece que construímos o direito a uma intimidade da qual só participam as pessoas que elegemos, agora sexualmente. Aos amigos e parentes o contato é por aperto de mão, pseudos beijinhos no rosto. Alguns conseguem demonstrar afeto através de um abraço “amarelo”, ou um abração. É quando deixamos que a pessoa participe da nossa intimidade de fato, pois os corpos se encostam, na troca de energia, calor. Nas relações conjugais nem sempre os casais conseguem manter ao longo da relação o toque, o afeto, o beijo entre eles. E quanto mais tempos idos, parece que o que fica além da troca afetiva com os netos, é uma sequidão de afeto. Mas o ser humano busca uma vinculação por medo de ficar só, e teme a segregação. Uma vez lendo Roberto Shiniachik, em seu livro “A Carícia essencial”, lembro-me que li uma frase, mais ou menos assim: “Dê-me um afeto, dê-me um afago, qualquer afeto, qualquer afago”. O autor referia-se às crianças insubordinadas, as que preferem a insubordinação para receberem inclusive as broncas, as agressões verbais, ou até as físicas. É melhor do que não receber, do que sentir a ausência de afeto. E dizia que na vida adulta acabamos tendo o mesmo comportamento. Preferimos estar com pessoas que, num conflito crônico, nos agridem verbalmente, ou moralmente, do que enfrentarmos a solidão, pois isso significaria total falta de afeto. Bem, esses pensamentos voltaram a minha mente porque lendo um livro mais recentemente, tomei ciência do desenvolvimento científico, do que levou aos procedimentos atuais nas maternidades neonatais e quero compartilhar com você. Na década de 80, os prematuros ficavam em incubadoras hermeticamente fechadas, com luz ultra violeta. E o aviso na incubadora alertava – Não Toque – pois eram muito frágeis. Segundo David Servan, no livro “Curar”, mesmo as incubadoras sendo a prova de som, o choro que vinha delas era de tristeza e de cortar o coração. Mas todos cumpriam rigorosamente as determinações prescritas. E embora todas as variáveis estivessem controladas, em termos científicos, o número de bebês que não cresciam era enorme, segundo ele, misterioso, um tapa na cara. A pergunta era – Por que a natureza se recusava a cooperar? Até que um dia, numa maternidade, os médicos observaram que alguns bebês estavam crescendo normalmente, ainda na incubadora. Se nada tinha mudado nos procedimentos, começaram uma investigação. Os bebês que estavam crescendo eram os observados por uma enfermeira da noite, que começara trabalhar há pouco tempo. Questionada, acabou confessando que não aguentava o choro triste deles, seus pequenos pacientes, e havia várias semanas que ela massageava as costinhas de cada bebê para acalma-los. Ela fazia furtivamente, é claro, mas percebeu que nada aconteceu aos bebês e começou a fazer mais despreocupadamente. Desde então, as pesquisas realizadas confirmaram esse resultado até em filhotinhos de ratos, veja você! O grande mérito é da carinhosa enfermeira, porém seu nome nem é citado. Os procedimentos hospitalares evoluíram a partir disso e se você teve um bebê na sua família que necessitou cuidados neonatais, sabe bem que hoje as mães passam o dia inteiro lá, com seus filhinhos, inclusive no “canguru”, amarradinhos ao corpo delas com uma fraldinha. Conclusão científica – O contato emocional é inegavelmente necessário para o crescimento – e para a sobrevivência. Na idade adulta, menos do que poderíamos, temos certos contatos físicos, e com dificuldades, pois há mulheres que não conseguem abraçar os colegas, há homens que não conseguem abraçar as colegas. Bastante comum encontrar pais que não abraçam os seus próprios filhos. Com o passar dos anos, as pessoas acabam sozinhas e quase sem contato físico, morre um cônjuge, enfim, é como se o idoso não necessitasse mais de carinho, ele que deu, não precisa agora receber. Só que a conclusão científica é clara quando diz – sobrevivência-. E como fazer para receber afeto? C. Gustav Jung (Psiquiatra) afirma que somos levados em direção do que necessitamos, ou queremos muito. E que é uma situação inconsciente portanto nem sempre é o melhor caminho, pois não existe um pai amoroso dentro do cérebro, só um cérebro que entende um comando e vai agir, mesmo sem a consciência do comandante. Sem perceber começa uma série de doenças infindáveis, reais, somatizadas das emoções, porque de certa forma, quando estamos doentes, despertamos o interesse das pessoas mais próximas, e o perigo reside no fato de procurarmos doenças para recebermos algum tipo de afeto. Toda doença é em última instância, uma tentativa frustrada de cura, e o afeto seria o ganho secundário, o que necessitamos para “sobreviver”. Dê-me qualquer tipo de afeto. Para receber atenção, pode-se ainda seguir o script de uma pessoa chata, exigente, resmungona, amarga, ou doente, e com isso recebe-se o pior tipo de afeto, aquele onde as pessoas se sentem na obrigação de atender, suportar, mas nunca de acariciar. E... sobrevive. Agora voltamos ao nosso assunto, a carícia que se perdeu no adulto. Perca a vergonha de manifestar seu bem querer, chegue mais perto, abrace mais. Deixo uma pergunta aos idosos cujos netinhos já passaram da adolescência - Você recebe afago e beijo de alguém? Quero deixar também uma pergunta aos adultos que ainda têm a benesse de desfrutar seus pais idosos: - Você acaricia, afaga, “abraça um abração” e beija seus pais? E você amigo leitor: - Já abraçou um abração hoje? Matéria publicada no jornal dia 10 de abril de 2012

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