TRANSTORNO EXPLOSIVO INTERMITENTE
Maneco desce até a garagem do prédio juntamente com Cris. Lado a lado esperam o final do percurso num silêncio sepulcral, motivado por uma discussão que, segundo Cris, era infundada. Aliás, o casal entra constantemente em discussão, onde irritadiço, Maneco excede a ira em palavrório chulo, deixando Cris cada dia mais distante dele. Representam os casais comuns, nada de mais além de muitas desavenças, porém houve um dia, quando ela ralou o pára-choque do carro na garagem,que... Nossa!!! Maneco não conseguiu se controlar parecia um leão ferido, e por pouco não avançou no pescoço da Cris, mas chegou a segurar nele. Foi quase uma tragédia. E alguns episódios dessa monta aconteciam de vez em quando provocando estresse, medo e insegurança na Cris. Nesse dia, ambos seguiam para o shopping, ele dizendo que odeia tumulto, lugares fechados, aquela garagem baixa e sufocante. E ela insistindo em comprar o presente para o casamento da prima. A lista estava lá. Maneco era assim, ria pouco e se estressava muito. Amargo, várias vezes demonstrava-se mal humorado a acompanhava de malgrado, mas ela relevava, e esperava que amadurecesse esse olhar intransigente e duro de viver a vida, que ela creditava ao passado, e a uma possível adolescência ainda presente no marido. Maneco estaciona o carro e Cris desce no momento em que o motorista do outro carro estacionado ao lado abre a porta bruscamente e acerta a perna de Cris. Ela se assusta, e reclama da dor com um gemido. Há discussão rápida entre os homens, forma-se um pequeno tumulto, e Maneco, cego de ira sente um branco, para de ver e ouvir, e subitamente num impulso acerta um soco de direita na face do motorista. O motorista cai no chão do estacionamento atordoado, desfalece, e o saldo dessa confusão é: uma fratura de face e afundamento do olho no motorista, com deslocamento da retina, pois era um senhor de mais de setenta anos, e Maneco, forte e viril, tinha a força das trinta e cinco primaveras. E agora está com um processo judicial por agressão física, e lesão corporal. Não é mais réu primário, e não pode sair do País até o julgamento, que, tudo indica, será condenado. Maneco alega nem ter percebido que se tratava de uma pessoa de mais idade e que reagiu em legítima defesa, pois o motorista estava agredindo sua esposa. -”Mas o que aconteceu que Maneco reagiu tão impulsiva e desmedidamente? A ira incontrolável mediante situações controláveis e banais demonstra algum transtorno?” Sim, percebe-se que algo não vai bem com o nosso protagonista, e vamos entender o que é. Na verdade ele fez uma análise equivocada dos fatos e reagiu de forma maximizada em relação ao ocorrido. Está interpretando os fatos em geral equivocadamente. Segundo Laplanche no livro Vocabulário da Psicanálise, há uma deformação de um processo normal. E ocorre a atuação inconsciente de um mecanismo de defesa, a projeção, fator propulsor metapsicológico de tal reação. A projeção é uma deformação que nos leva a procurar no mundo exterior a causa dos nossos afetos. Geralmente o desagradável é o que é projetado. Por exemplo, -“O odeio-o” é transformado em “ele me odeia”, o que vai “me conceder” o direito de odiá-lo. Temos aqui uma amostra da atuação de portadores de Transtorno explosivo intermitente. Pessoa vítima desse transtorno será vista como violenta, tem a vida desperdiçada em confusões, em desavenças, brigas, e sentimento exagerado de ira produzindo: inimizades, tensão, alto nível de estresse e ansiedade. Está sempre apreensivo, muitas vezes mal humorado, seu mundo é cinza. Vive com muita adrenalina no sangue, mas não é esportista e não a queima, e isso pode não acabar bem. O corpo vai cobrar uma postura mais coerente, ou vai psicossomatizar, isto é, adoecer, no futuro. Essa pessoa não desperta piedade, mas ela sofre. Se você conhece alguém ou se identifica com a maioria desses sintomas emocionais do texto, então pode ser portador de transtorno explosivo intermitente e necessita ajuda. Um tratamento ideal é conciliar psicoterapia com psiquiatria. O trabalho casado ajuda muito para orientar mudanças nesse comportamento. Não demore em decidir, busque ajuda, está perdendo o lado colorido da vida.
Matéria publicada no jornal dia 10 de Novembro de 2013.
