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IDADES -TER NÃO É SER


“A passagem do tempo deve ser uma conquista, não uma perda”

Lya Luft


Lendo o livro Inteligência multifocal, de A. J. Cury, encontrei um trecho muito interessante sobre o efeito do prazer nas diversas idades e o quanto a psicoadaptação o influencia. Acreditando –o tão pronto e simples, resolvi transcrever essa frase, para uma reflexão sobre os rumos reais das nossas vidas, principalmente se você já colecionou algumas primaveras a mais.

“...Nenhum ser humano vive a vida como uma eterna primavera existencial... Todos vivem misérias emocionais, angústias e conflitos existenciais, pois não escapam da rotina psicossocial, do tédio e da redução da capacidade de sentir prazer ao longo da tragetória de vida...”

Claro que nos lembramos dos prazeres de infância, onde apertar uma campainha, sair correndo para nos escondermos e ficar observando o dono da casa procurando quem a apertou, nos fazia rir muito; ter a possibilidade de fazer fogo com gravetinhos, colocar uma lata vazia, que foi da manteiga, em cima do fogo com um punhado de arroz “roubado” da despensa da avó, onde o cozido ainda ficava cru, porém o comíamos com gosto, e rápido, para não “despertar suspeitas” sobre o mal feito. Era tudo muito emocionante. Era o descortinar de mil possibilidades.

Na adolescência, a companhia dos amigos, o violão dependurado nas costas, um som (que nem sempre era bom), juntado a uma cantoria mesmo que desafinada, que delícia era. E um beijo roubado? Nossa, quantas emoções para descrevê-lo aos amigos...

E a vida vai nos acontecendo como se todas as experiências fossem de puro êxtase.

Podemos recordar com emoções agradáveis esses fatos, porém, ao adulto ou ao velho, eles não trariam sentido para a vida, é bom recordaddr, mas ninguém optará em reproduzir essas ações. Nosso mecanismo de psicoadaptação atua e não vemos mais graça nisso. Nós temos essa capacidade, a psicoadaptação, uma das etapas inconscientes do processo de interpretação, nos adaptamos e aquilo deixa de ter o mesmo peso, pela tendência de minimizar as dores e horrores de tanto conviver. No mesmo rumo, minimizamos as alegrias e satisfações. Nos lançamos então em busca de mais emoções. E a vida dos adultos e dos idosos as vezes se estabelece com mais dificuldades para encontrar estímulos que nos dêem prazer, o que torna os idosos em geral mais tristes, com menos interesse pela vida. Mas dependerá de como se exteriorizava, se não tinha algumas capacidades, como da arte da contemplação do belo, do exercício do bom humor; e então a vida se tornará angustiante e tediosa. Um poço de angústia.

Enquanto as crianças se distraem com pequenos objetos, os jovens explodem de emoção,com pequenos eventos, os adultos perdem parte do prazer, além da psicoadaptação, mas também por conta das exigências do intelecto, devido a expansão cultural adquirida, e mesmo por conta da sua personalidade que se acentuará. Essa redução quantitativa do prazer só pode ser compensada pela expansão qualitativa do prazer, através da interiorização, das amizades profundas, das artes, dos projetos sociais bem como dos projetos de vida.

As pessoas que são saturadas de ansiedade, humor deprimido, estresse, e que vivem na competição desenfreada do consumo, da forma corporal perfeita, fazem um cerco em torno de si e acabam encarceradas emocionalmente, infelizes. E pode reparar leitor, que você vai encontrar muitos velhos num corpo jovem. Mas poderemos encontrar muitos jovens num corpo velho também.

“Reis podem tornar-se pobres, sem prazer existencial; pobres podem tornar-se ricos emocionalmente, verdadeiros poetas da existência, ainda que não sejam amantes das letras” , afirma Cury. Isso porque no universo das emoções, ter não é ser. A capacidade em lidar com esses elementos e gerenciar a atuação desses fenômenos, fará expandir a sua capacidade de sentir prazer.

A arte da contemplação do belo é raramente desenvolvida nas sociedades modernas. A indústria de entretenimento não pode expandir essa sofisticada arte; ela tem de ser aprimorada no caminhar inteligente e emocionado das pessoas.

Estar aberto para as renovações que implacavelmente acontecerão, atento para procurar situações que verdadeiramente lhes fazem algum sentido, torna-se necessário se você pretende SER jovem sempre, apesar dos anos que viverá. Mas isso não implica em perder completamente as referências e os ideais antigos, eles o impulsionarão para as atitudes sublimadas.

“Cambia, todo cambia...,pero no cambia mi amor, por mas lejos que me encuentre, ni el recuerdo ni el dolor de mi pueblo y de mi gente” Mercedes Sosa


Matéria publicada no jornal em 10 de junho de 2015.

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