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NA HORA DA DESPEDIDA


Sempre que perdemos uma pessoa que nos seja cara, parentes ou amigos, somos forçados a refletir sobre esse fenômeno denominado morrer, que é o antônimo do nascer. Sabemos muito bem que em todos os tempos , em qualquer povo, existe um respeito, e uma tristeza ligados a esse fato e sempre é pesar, mas pode ou não ser um pesar muito grande. É que de acordo com as crenças, são traçados caminhos imaginários para aquela boa alma, porém, quem fica,nada há que console de imediato aquele que sofre com a ausência, a perda.

Tenho para comigo que falando de perdas, não há uma mais significativa do que a morte de um filho, levando-se em conta que os pais estão empenhados em fazê-lo viver e aprender o bem viver, que nada mais é do que o elo entre nascimento e morte. E a tarefa dos pais resume-se justamente em prolongar ao máximo o seu viver, protegendo-o e livrando-o dos possíveis joios impeditivos a esse processo.

Por outro lado a perda dos pais por filhos, se jovens, trará como consequência o desamparo e deixará um vazio pela ausência da figura parental, uma vez que os pais são fundamentais no processo do desenvolvimento emocional e do caráter dos filhos, dando-lhes as referências necessárias para viverem depois como adultos saudáveis.

Mas de todo jeito, em todos os tempos e de qualquer forma, nunca queremos passar essa experiência, e quando temos alguém enfermo em fase terminal, o medo de perder acarreta um relacionamento permeado pela ocultação de sentimentos e torna-se falso, pois por ser difícil admitir a perda, fica difícil conversar com o enfermo sobre a sua doença e o possível desenlace de sua doença, que poderá ser fatal. Com isso não haverá outra saída ao enfermo, a não ser engolir sua angústia mediante a negação de que está doente e de que está pressentindo a própria morte. Só queremos sentir o nosso lado e com isso, negamos a ele a possbilidade do desabafo, e a possibilidade de receber consolo mediante uma constatação compartilhada. Poder dar escuta nessa hora é muito importante, deixá-lo chorar, lamentar, com a certeza que só depois disso poderá acontecer uma rápida paz, alguns minutos de trégua ao desespero e dor.

Vamos olhar melhor para os dois personagens, um que perderá a pessoa, e outro que perderá a vida.

No lado de quem perde a pessoa.

Sim, é horrível a idéia de deixar de conviver para sempre com alguém que você quer muito, porém a morte não é um problema, não se tem uma resposta para solucioná-la, é um fato, é uma constatação. E na vida, acontecerá há qualquer momento. Mais tarde ou mais cedo. Mas nosso egoísmo fala mais alto. Temos dificuldades em lidar com as frustrações, e não gostamos de perder. Isso é do ser humano. E quanto menos lidarmos bem com frustrações, mais sofreremos a perda. Por isso durante o nosso desenvolvimento, ao longo das experiências, temos pequenas perdas com as quais devemos aprender a lidar: não receber um presente, não sair para uma balada, não comprar uma roupa, não receber a mesada; e outras, maiores,como a perda dos nossos animaizinhos de estimação, perda dos nossos amigos por mudança. Quanto mais passarmos por essas vivências, mais tolerantes ficamos em relação às perdas. Não lidar com frustrações leva a não lidar com as perdas, e isso nos impossibilitará escutar a pessoa no leito da morte, não por ela, mas por nós que não queremos pensar em perdê-la. Depois do fato consumado, quando tudo se acaba, é bem comum o sentimento de culpa, onde a pessoa que fica, sempre se julga a partir daquilo que não fez. É verdade que todos podemos fazer muito e é uma questão de opção, mas a vida nos impõe caminhos para a sobrevivência que as vezes são cruéis, desumanos, tomam o nosso tempo, percorremos grandes distâncias, além dos compromissos com as outras pessoas . Mas sim,é a verdade – você poderia ter feito mais e melhor – mas estava naquele contexto” X” que não o possibilitou. Só que não foi por isso que a pessoa se foi, não temos esse poder e não foi a vingança de um Deus zangado. Acredite que você fez tudo o que podia naquele momento. E que só resta a compreensão e conformação. Enfim,deve admitir o quanto é frustrante viver sem aquela pessoa, e elaborar essa perda. É o que denominamos luto. E se a inconformidade se fizer maior, poderá fazer um quadro depressivo. Você está sem a possibilidade de ganhar, com muita raiva por ter perdido e altamente frustrado. Sentindo a própria impotência mediante o que não podemos mudar.Mas e o lado de quem se foi? Como foi?Como disse no início, todos usamos o nosso imaginário, quero aqui transcrever o epílogo do livro “Dizendo Adeus” de Evaldo A.D Assumpção, que se parece ao meu imaginário.“Conta-se que um rio nasceu no alto de uma enorme montanha e iniciou a sua jornada. Foi descendo pela encosta e pouco a pouco foi crescendo, aumentando de volume. Projetou-se numa maravilhosa cachoeira e atingiu o sopé da montanha.Foi abrindo passagem entre as árvores e pedras, algumas mais facilmente, outras com dificuldade,Admirava-se,ora de sua força, ora de sua habilidade para contornar obstáculos. E crescia.Passou por planícies e por áreas ressecadas. Umideceu-as dando-lhes a condição de acolher as sementes para florescerem e darem frutos.Matou a sede da terra,de povos, de animais e pássaros.Conheceu outras correntes de água e as reuniu em si, tornando-se maior e mais fecundo. Os peixes multiplicavam-se em suas águas.Era feliz!


Matéria publicada no jornal em 10 de abril de 2015;

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