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E QUANDO FOR O SOL POENTE



“A passagem do tempo deve ser uma conquista, e não uma perda!”

Acredito que você leitor amigo, assim como eu, também se dá conta de como as coisas mudam. Estou lembrando quando minha avó materna, adoecida, as filhas e nora que moravam no mesmo bairro e puderam revesar entre si os cuidados dedicados para uma pessoa enferma mas ainda relativamente jovem, pois vovó Julia tinha 49 anos quando faleceu. Seus cinco filhos estavam entre 25 e 35 anos.

Hoje as pessoas vivem bem mais devido às melhores condições de vida em geral. A mamãe está com 89 anos! Segundo a revista PRE UNIVESP, em 2013 havia no mundo 841 milhões de pessoas com 60 ou mais anos. E no Brasil 26,3 milhões, equilavente a 13% da população. Na previsão para 2020 no Brasil teremos um aumento nessa proporção e passaremos a ser 29% da nossa população entre 60 ou mais. Isso porque demoramos mais a morrer enquanto nascem menos devido ao controle de natalidade.

As pessoas daqueles tempos sempre acreditaram que seriam cuidadas como cuidaram, só que não. Condições muito diferentes impedem que esse processo se repita na grande maioria das famílias. As distâncias físicas dos filhos e as imposições sociais atuais em geral ,não permitem à maioria largar o emprego para cuidar do seu idoso. Temos um impasse: de um lado o surgimento de uma nova profissão – o cuidador- que por fazer um curso básico de uma semana se acha no direito( e a lei trabalhista concorda) de cobrar grandes quantias por um trabalho nem sempre bem desempenhado, porque pode haver suficiente cuidado mecânico mas não significa bons tratos; e de outro lado a reclamação do idoso cobrando muito a presença dos filhos por conta de sua carência, exigindo a atenção que “sonhou” para si a vida toda. Entre o cuidador e o familiar - os filhos – recaindo muitas vezes toda a responsabilidade da situação à uma filha que, devido também a ter idade, é solicitada como mãe, avó, profissional, e esposa. Difícil parar de trabalhar, lembrando que é preciso mais do que nunca dinheiro para os gastos necessários para a manutenção dessa estrutura.

As histórias se repetem e em toda família é fácil encontrar filho que se isenta parcial ou total de responsabilidade só comparece para criticar os que se esvaem entre administrar essa situação, mais o desgaste e a tristeza que é acompanhar o processo degenerativo de senilidade dos pais.

Definição de senil é decrépito, estragado pelo excesso de uso. Assim ficaremos inexoravelmente um dia, se tudo nos der certo, nosso sol se esconderá tranquilamente, lento e gradativo, até nosso último brilhinho se esvair na escuridão.

Falar sobre lentificação desse processo faz-se necessário, pois enquanto os que estão na faixa de sessenta, setenta, comportam-se como inconsequentes, sem olhar para a própria realidade,não cuidam do corpo com bons alimentos, e colecionam na mente raivas rancores e egoísmos; fumam e bebem em excesso, deixam de rir, tornam-se mestres da crítica, do mau humor e da ociosidade, rejeitam conselhos médicos porque já sabem tudo. Enquanto assim fazem estarão plantando uma “herança do mal” que seus filhos herdarão antecipadamente, e que se estenderá por vários anos. Os filhos é que arcarão com os resultados desse comportamento rebelde, orgulhoso, arrogante, com muito mais trabalho e dor. Amando os pais, sofre o tempo todo enquanto cuida.

Devemos lembrar que nas casas fazemos lares preparados para ativos, os que gostam ou precisam desse espaço para viver. Mas para receber um idoso e acamado a estrutura pensada anteriormente precisa ser desfeita, e montada uma outra quase sempre no improviso.

Na minha convivência com as pessoas vejo que há muito preconceito sobre assuntos importantíssimos, como exemplo:- doação de órgãos, prolongamento de vida com aparelhos artificiais, e cuidados nos últimos raios de sol.

Por que não conversar com seus filhos quando você perceber que o sol começa a se por e já lança algumas sombras sobre a sua pessoa? Por que acreditar que os filhos serão os únicos responsáveis pela sua felicidade quando o sol estiver por um fio tênue? Por que não se atualizar, e aceitar a realidade de que maus profissionais, lugares adaptados, pessoas na correria da sobrevivência, não conseguem realmente oferecer o melhor para você? Por que deixarmos esse período de trevas que será inevitável , ofuscar o brilho que tivemos um dia, sombreando a vida daqueles que amamos?

Faz-se necessário pensar a velhice com ousadia e coragem, estabelecendo mudanças. Deixar de lado hábitos e padrões antigos, modernizar-se a tempo para lentificar ao máximo o processo do envelhecimento. Se sua saúde for boa você sofrerá menos, terá mais facilidade para entender o contexto, para sorrir, sem as dores incuráveis de doenças crônicas ou imaginárias. E se não quiser fazer isso porque acha que você não merece ser feliz, faça-o pela felicidade dos seus filhos, afinal , seu filho ter de enfrentar menos problemas, não é o que todo pai quer?

E o que é essa carência toda? As chantagens dos velhinhos os deixam chatos, birrentos, intransigentes e difíceis para conviver. Porque durante a vida adulta não se interessaram por outros assuntos além do trabalho e filhos. Acabado o trabalho, os filhos “pagam o pato” pela falta de hobbies, interesses, de curiosidade, de falta de vontade de viver outras experiências além da familiar. Medos e amarras que permaneceram limitando a vida.

Temos de perceber e pensar quando nosso tempo de querer e de mandar já se esvaiu para respeitar os novos tempos a serem vividos, e quase sempre com os filhos no comando.

Deixe esse período claro para você. Não tememos aquilo que conhecemos, na medida em que conseguimos “armas” para enfrentar o que vem pela frente, então informe-se , converse, leia o que puder sobre os tempos sem sol.

Perceba que, se seus filhos sempre o amaram, nada muda, apesar de não o cuidarem todos os dias e dê o seu melhor nas visitas que deles receber.

Seja você um irradiador contumaz de calor, aquecendo sua família, ou uma nova família num lar para idosos, numa casa de repouso, com a sua garra e determinação para enfrentar esse período que virá . Não se lastime, mas agradeça por ser um sobrevivente a tantos males e tragédias.

A água não gosta de pessoas rígidas e que gritam socorro ao contato com ela. Irada, afunda e afoga essas pessoas. Mas quando ao relaxar você deixar que ela o leve porque o volume todo dela é muito maior, é assustador, a água se rende e o fará boiar; e acolhedora, o embalará levando-o à margem. Até encontrar o grande barco.

E quando você for passageiro da embarcação que nos conduzirá um dia, deixará muito de você com eles, que por conta de todos esses exemplos de vida, nunca o esquecerão, e assim conquistará a verdadeira imortalidade.


“Não se mede a vida de uma pessoa pelo que ela acumula, mas sim pelo que ela distribue.”


Publicado no jornal em 10/04/16

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